Os ministros Gilmar Mendes e Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), e a ministra Maria Elizabeth Rocha, presidente do Superior Tribunal Militar (STM), receberam nesta terça-feira, 8, lideranças indígenas para discutir a tese do marco temporal e o combate às mudanças climáticas.
Entre 6 e 8 mil indígenas de vários povos do Brasil, países da Bacia Amazônica, América Central e Oceania participam nesta semana do Acampamento Terra Livre, organizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em Brasília.
De acordo com a Apib, foram apresentadas nos encontros "reivindicações sobre o respeito ao direito originário previsto na Constituição e o reconhecimento da demarcação das terras indígenas como uma política de enfrentamento ao aquecimento global".
O ministro Gilmar Mendes é relator das ações sobre o marco temporal. Durante a reunião, que durou cerca de 40 minutos, ele reforçou o convite para a Apib voltar para a comissão de conciliação. O grupo foi criado depois da decisão do magistrado de suspender processos de instância inferiores relacionados ao tema, e busca a "construção consensual" de um anteprojeto para alterar a Lei do Marco Temporal.
Em agosto do ano passado, a organização, que representava os interesses dos indígenas na discussão, se retirou por entender que os direitos dos indígenas são inegociáveis e que não havia paridade no debate desenvolvido no STF. Procurada pelo Estadão, a Apib informou que não vai se posicionar sobre o convite do ministro no momento.
Segundo Gilmar Mendes, a decisão de abrir o processo de conciliação e mediação para tratar do marco temporal não impede o governo federal de realizar demarcações de terras indígenas.
A tese do marco temporal restringe o direito de demarcação de terras indígenas apenas às áreas ocupadas na data de promulgação da Constituição de 1988. Ele foi declarado inconstitucional pelo STF em setembro de 2023, mas projeto em tramitação no Congresso Nacional sugere sua inserção no texto constitucional por meio da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 48.
Encontro no STM
No Superior Tribunal Militar, cerca de 30 representantes dos povos indígenas brasileiros foram recebidos pela presidente da Corte, a ministra Maria Elizabeth Rocha.
Segundo o STM, o grupo apresentou preocupações relacionadas à participação dos indígenas nas Forças Armadas, ao avanço do narcotráfico nas terras indígenas, à destruição ambiental e à necessidade de maior representatividade em espaços institucionais.
A ministra disse que vai garantir a presença de representantes indígenas no Observatório Pró-Equidade, que será lançado em maio, e promover novos encontros com comandantes das Forças Armadas, representantes da magistratura e lideranças indígenas para tratar de temas como o combate à violência contra mulheres indígenas e a presença do crime organizado nas regiões de fronteira.
"Assumo a responsabilidade que o Estado brasileiro tem em relação às violações históricas sofridas pelos povos originários. Não quero que isso fique restrito ao discurso", afirmou, sugerindo que os encontros podem resultar na elaboração de uma carta aberta com propostas, a ser encaminhada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ao Exército.
Projetos apresentados na Câmara
Na Câmara, foram protocolados quatro projetos de lei que, segundo da deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG), foram "construídos com base na escuta dos povos indígenas":
- Projeto de Lei 1527/2025: Lei Contra a Violência Obstétrica a Mulheres Indígenas, prevê a presença de parteiras tradicionais, respeito a línguas e ritos canais para denunciar violências, entre outras providências;
- Projeto de Lei 1528/2025: inclui agricultores familiares indígenas, quilombolas, ribeirinhos, extrativistas e pescadores artesanais entre os beneficiários do Garantia-Safra;
- Projeto de Lei 1529/2025: apoia a denominação de origem de produtos ou serviços comercializáveis resultantes dos modos de ocupação tradicional dos povos indígenas;
- Projeto de Lei 1530/2025: institui fundo nacional para financiar e apoiar pesquisas e ações destinadas ao desenvolvimento de produção agroecológica.
Os projetos aguardam despacho do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e devem passar por análise nas comissões da Casa.
A sessão solene, em que os projetos foram anunciados, também contou com discursos do cacique Raoni Metuktire, de 93 anos, da ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, e da presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joênia Wapichana.