Lição da ditadura explica polarização saudável, diz chanceler do Uruguai

Internacional
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Apesar das diferentes propostas de governo, as campanhas eleitorais para o 2º turno no Uruguai foram marcadas por uma rara tranquilidade, até para o país, em um contexto mundial em que a polarização e as ameaças democráticas se tornaram a regra. Para o ministro das Relações Exteriores uruguaio, Omar Paganini, o segredo está no forte sistema de partidos que não permite o surgimento de "outsiders".

Segundo ele, as lições da ditadura militar seguem vivas na sociedade, fazendo com que a democracia seja um pilar a se proteger. O chanceler conversou com o Estadão durante sua passagem pelo Rio para a cúpula de líderes do G-20 como representante do presidente, Luis Alberto Lacalle Pou.

Uruguai não caiu na polarização extrema. Por quê?

Graças a um atributo muito positivo que o Uruguai tem, de um diálogo político civilizado, como se pôde ver quando assumiu o presidente Lula. O presidente Lacalle Pou veio ao País com dois presidentes anteriores, um deles Mujica, da Frente Ampla, e o outro Sanguinetti, do Partido Colorado. Isso mostrou como o sistema uruguaio é maduro e tem um alto nível de diálogo. Em campanha, claro, as discussões são mais fortes. Há modelos diferentes entre os dois partidos, diferenças substanciais com relação aos temas. Há muito a ser discutido, mas se discute de maneira saudável.

E qual seria o segredo do Uruguai?

Acredito que são dois segredos. Um, o sistema de partidos fortes que o Uruguai tem, que permite processar o debate político pelas legendas, e não por "outsiders" ou esquemas de fragmentação. Em outros países da América Latina, vemos que os partidos políticos têm se fragmentado muito, o que dificulta o diálogo político. Mesmo em países que têm sistemas partidários fortes, como o Chile, também aconteceu. Mas esse é um dos segredos. O outro, o Uruguai aprendeu com a ditadura militar, entre 1973 e 1984, e todos no sistema de partidos valorizam muito a institucionalidade democrática. No fundo, a ninguém serve romper com o sistema, porque todos os partidos passaram pelo governo e todos têm a esperança de voltar, de modo que o sistema funciona de maneira que é bom para todos que continue funcionando assim.

Qual o peso do fator social da sociedade uruguaia?

A forma de ser do uruguaio é conhecida. Somos gente de diálogo. É uma sociedade menor. Falamos (antes) dos graus de separação. Toda a humanidade está conectada por seis graus de separação, mas no Uruguai são só dois, provavelmente. E isso também facilita o diálogo. Essa é uma receita que não é tão exportável.

Mas há como ensinar a outros países?

É muito difícil aplicar a mesma receita em outro país. Além disso, seria um pouco insolente da nossa parte sair tentando dar aulas sobre realidades tão diferentes e especiais. Em geral, nos países da América Latina, vemos que isso é muito valorizado pela sociedade, apesar das dificuldades da polarização. Infelizmente, alguns países têm deslizado na direção da ditadura. Eu me refiro a Venezuela e Nicarágua. É de interesse da região inteira que em todo o continente vigore a democracia. Isso nos dá estabilidade, paz e nos faz crescer. É muito importante que todos juntos pressionemos, façamos o que for preciso para que a Venezuela volte ao caminho democrático.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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O procurador-geral da República, Paulo Gonet, deverá receber nesta semana o relatório de mais de 800 páginas elaborado pela Polícia Federal (PF) com a descrição da tentativa de golpe de Estado que levou ao indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outras 36 pessoas. Gonet tem três alternativas a partir da análise das provas reunidas pelos agentes federais: denunciar os indiciados, arquivar o caso ou solicitar novas diligências.

A lei estabelece que Gonet tem 15 dias para se manifestar sobre o relatório da PF, mas não há prazo legal para que ele decida sobre a apresentação de denúncia contra os indiciados. A expectativa é que as denúncias só devem ocorrer em 2025, com a junção dos casos sobre fraude em cartões de vacinas e desvios de joias da Presidência à análise da tentativa de golpe. Até lá, o procurador-geral contará com uma equipe dedicada exclusivamente a destrinchar os achados dos agentes federais.

O Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos (GACC) é composto por nove procuradores. Eles vão se debruçar sobre o trabalho da PF para embasar as denúncias a serem apresentadas pela PGR. O coordenador da equipe é o procurador Joaquim Cabral da Costa Neto. Ele trabalhou na equipe de Gonet no Ministério Público Eleitoral durante a gestão do ex-procurador-geral Augusto Aras. A análise dos indiciamentos feitos pela corporação ainda deve contar com o apoio de servidores e assessores da Procuradoria-Geral.

Integrantes do Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos

Joaquim Cabral da Costa Neto, coordenador - Procuradoria da República no Município (PRM) de Garanhuns (PE)

Adriana Scordamaglia Fernandes - Procuradoria Regional da República da 3ª Região

Catarina Sales Mendes de Carvalho - Procuradoria da República no Estado do Amazonas (PR-AM)

Cecília Vieira de Melo - Procuradoria da República no Estado do Amazonas (PR-AM)

Daniel José Mesquita Monteiro Dias - Ministério Público Eleitoral de Pernambuco (MPE-PE)

Gabriela Starling Jorge Vieira de Mello - Ministério Público de Goiás (MP-GO)

Lígia Cireno Teobaldo - Procuradoria da República no Pará (PR-PA)

Leandro Musa de Almeida - Procuradoria da República no Município (PRM) de Guarulhos (SP)

Pablo Luz de Beltrand - Procuradoria da República no Mato Grosso (PR-MT)

O grupo foi criado por Aras em janeiro de 2023 logo após as invasões aos prédios dos Três Poderes por golpistas apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro. A equipe foi coordenada até dezembro do ano passado pelo subprocurador-geral Carlos Frederico Santos, que apresentou boa parte da denúncias contra os envolvidos nos atos de vandalismo do 8 de Janeiro.

Frederico Santos deixou o comando do grupo logo após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) indicar Gonet para o cargo de procurador-geral. Durante o seu período como coordenador, o subprocurador deu diversas declarações sobre a condução das investigações, como a de que "uma pessoa inspirou" a tentativa de golpe de Estado do 8 de Janeiro.

Ele também afirmou que a delação realizada pelo tenente-coronel Mauro Cid à PF, em novembro do ano passado, era mera narrativa, àquela altura, e que seriam necessárias diligências para comprovar as acusações do ex-ajudante de ordens da Presidência no governo Bolsonaro. "Eu não trabalho como o pessoal da Lava Jato. Eu trabalho com provas concretas para que as pessoas sejam denunciadas com provas irrefutáveis", disse à época ao Estadão.

Na última quinta-feira, 22, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes manteve a validade da delação premiada de Cid após colher um depoimento de três horas do militar.

O sucessor de Frederico tem perfil mais discreto. Costa Neto não concedeu entrevistas desde que assumiu o cargo, mas a PGR tem divulgado os feitos do seu trabalho. Em boletim publicado na última terça-feira, 19, a instituição informou que 284 denunciados pelo Ministério Público Federal (MPF) pelas invasões golpistas de 8 de janeiros foram condenados.

O Grupo de Combate aos Atos Antidemocráticos também tem investido em acordos de não-persecução penal, nos quais os acusados se comprometem a cumprir penas alternativas, como serviços comunitários e assistir a um curso de reeducação sobre a importância da democracia. Segundo o MPF, 476 presas em flagrante após o 8 de Janeiro assinaram acordos.

Aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), indiciado pela Polícia Federal por golpe de Estado, o governador de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), disse neste sábado, 23, que o Brasil "precisa de paz para trabalhar" e que o clima de "tiroteio" e "discórdia" dificulta a tarefa de fazer um bom governo.

Mello não mencionou diretamente a situação de Bolsonaro, que segundo a PF cometeu, além da tentativa de golpe, os crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa, e de aliados do ex-presidente.

A declaração de Mello ocorreu no encerramento do 12º Encontro do Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud). O grupo é formado pelos governos de Santa Catarina, São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul.

"O Brasil precisa de paz para trabalhar. Nesse tiroteio que a gente vive não há condições. A gente tem que fazer um esforço muito maior pra dar conta de tudo que a gente tem que fazer. Se tivesse mais paz, mais tranquilidade, a gente podia render muito mais. O Brasil precisa de nós", discursou Jorginho Mello.

"Eu nunca vi discórdia construir nada. Nem uma pontezinha, nem um hospital, nem uma escola. Confusão não constrói nada, só destrói", acrescentou o governante catarinense.

A maioria dos governadores do Cosud são aliados de Bolsonaro. As exceções são Eduardo Leite (PSDB), que por estar em uma viagem ao exterior enviou o vice-governador gaúcho, Gabriel Souza (MDB), como representante, e o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB).

Os governadores de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), não mencionaram o ex-presidente nos respectivos discursos e se ativeram a temas relacionados ao consórcio. O governador de Minas, Romeu Zema (Novo), não participou do encerramento do Cosud.

Embora não tenha mencionado expressamente Bolsonaro, Jorginho Mello foi às redes sociais na tarde de sexta-feira, 22, demonstrar apoio ao ex-chefe do Executivo federal após o indiciamento pela Polícia Federal. Ele publicou uma foto ao lado de Bolsonaro na rede social X e escreveu: "O Brasil reconhece quem lutou pela pátria, família e liberdade. Juntos, seguimos com Jair Bolsonaro como inspiração de força e resistência. Aqui em Santa Catarina, o compromisso com os valores que nos unem é inabalável".

Tarcísio de Freitas, que tem o ex-presidente como padrinho político, também havia defendido Bolsonaro na quinta-feira. "Há uma narrativa disseminada contra o presidente Jair Bolsonaro e que carece de provas. É preciso ser muito responsável sobre acusações graves como essa. O presidente respeitou o resultado da eleição e a posse aconteceu em plena normalidade e respeito à democracia. Que a investigação em andamento seja realizada de modo a trazer à tona a verdade dos fatos", afirmou o governador de São Paulo, também no X.

Outros governadores que são próximos politicamente de Bolsonaro, mas apontados como possíveis candidatos a presidente em 2026, como Zema e Ratinho, ainda não se posicionaram sobre o indiciamento do ex-chefe do Executivo.

O ex-presidente Jair Bolsonaro classificou nesta tarde como "historinha" o inquérito que investiga tentativa de golpe de Estado. A Polícia Federal indiciou na quinta-feira Bolsonaro e ex-integrantes de seu governo pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado e organização criminosa. O ex-presidente alegou perseguição.

"Não acredito nessa historinha de golpe. Ninguém viu, sequer, um soldado na rua, ninguém sendo preso, nada. Obviamente, o Alexandre de Moraes (ministro do Supremo Tribunal Federal) inventando narrativas, com sua Polícia Federal bastante criativa", declarou em conversa com apoiadores em Alagoas neste sábado, 23.

Bolsonaro também disse que há "estardalhaços" sobre as informações já identificadas pelo inquirido. "Vai plantar batata. Pelo amor de Deus, deixa de querer perseguir as pessoas por interesse pessoal", afirmou.

A investigação foi iniciada no ano passado e concluída dois dias após a Polícia Federal (PF) prender quatro militares e um policial federal acusados de tentar assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, do STF.