Premiê sírio concorda em entregar o poder e rebeldes consolidam controle sobre Damasco

Internacional
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O ex-primeiro-ministro sírio Mohammed Ghazi al-Jalali concordou nesta segunda-feira, 9, em entregar o poder ao "governo da salvação" liderado pelo grupo rebelde Hayat Tahrir al-Sham que derrubou o regime de Bashar Assad, informou a agência Reuters citando a TV Al Arabiya. Os rebeldes, por sua vez, fizeram um gesto em favor de um governo de transição.

O premiê se reuniu nesta segunda com o líder dos rebeldes, Abu Mohamed al-Golani - que agora usa seu verdadeiro nome Ahmad al-Shareh - para tratar de um possível governo "que garanta o fornecimento dos serviços à população síria", disse o grupo rebelde em comunicado. Também estava presente na reunião Mohammed al-Bashir, que anteriormente serviu como chefe de uma administração comandada por rebeldes no noroeste da Síria, e é cotado como possível líder de um futuro governo.

Embora os rebeldes tenham alguma experiência governando o menor pedaço de território que eles anteriormente detinham, "independentemente disso, não podemos dispensar o Estado anterior", disse al-Golani ao premiê de Assad, de acordo com um frame da reunião postado no canal de Telegram da liderança rebelde.

No vídeo, al-Golani é ouvido dizendo sobre o próximo primeiro-ministro que, embora "Idlib seja uma região pequena e carente de recursos, as autoridades de lá têm um alto nível de experiência em começar do zero". Jalali disse que está pronto para cooperar com qualquer liderança escolhida pelo povo e para o processo de transferência.

O governo de salvação, que tem ministérios, departamentos, autoridades judiciais e de segurança, foi instalado em 2017 para atender à população de Idlib, que não contava com serviços governamentais no bastião rebelde. As autoridades da área começaram a fornecer serviços como água, comunicações e eletricidade para a segunda cidade da Síria, Aleppo, depois que ela foi tomada durante a rápida ofensiva.

Novo governo em Damasco

Um dia depois de tomar Damasco, a coalizão rebelde que se viu repentinamente no comando da capital síria e de suas instituições governamentais, se apressou nesta segunda para estabelecer a ordem, tentando preencher o vácuo deixado pela queda do regime do ditador Bashar Assad.

A liderança militar dos rebeldes anunciou em uma declaração no Telegram que suas forças estavam "prestes a terminar de controlar a capital e preservar a propriedade pública", e que estava formando um governo de transição. A declaração não nomeou o líder do governo de transição, mas as notícias locais disseram que seria Mohammed al-Bashir.

Os novos líderes de fato da Síria pareciam estar se esforçando para estabelecer segurança, estabilidade e continuidade. Embora tenha havido relatos no fim de semana de saques em instituições governamentais, escritórios e casas particulares, tanto antes quanto depois que os rebeldes entraram em Damasco, na segunda-feira, os combatentes rebeldes montaram guarda do lado de fora das instituições governamentais e direcionaram o tráfego por toda a capital. As novas autoridades também circularam imagens nas mídias sociais de agentes de segurança patrulhando as ruas da cidade.

Ao mesmo tempo, a agência de notícias estatal síria - que antes servia como porta-voz de Assad - havia mudado de nome com a bandeira verde, branca e preta dos rebeldes. Na segunda-feira, ela publicou uma série de decretos aparentemente destinados a estabelecer a ordem: funcionários estatais de petróleo, saúde e transporte estavam sendo chamados de volta ao trabalho, e haveria uma anistia geral para os milhares de militares de Assad que tinham sido forçados a servir.

O objetivo das novas autoridades parecia ser evitar o tipo de caos que tomou conta de outras nações árabes quando rebeliões derrubaram ditadores de longa data. Na Líbia, durante a revolta da Primavera Árabe de 2011, e no Iraque, durante a invasão americana de 2003, por exemplo, os saques foram generalizados e a ordem foi quebrada, levando grupos armados a disputar o poder e levando a anos de disfunção e violência.

Desafios

Jerome Drevon, especialista do International Crisis Group que estudou e conversou extensivamente com Hayat Tahrir al-Sham, disse que os combatentes lhe disseram desde a tomada de Damasco que se concentrariam primeiro em estabelecer a segurança e fornecer serviços básicos.

Isso será mais fácil dizer do que fazer, especialmente porque os rebeldes em toda a Síria não pertencem todos ao mesmo grupo. Hayat Tahrir al-Sham lidera o grupo em Damasco, que agora controla a maior parte do país. Outro grupo domina no sul. Forças lideradas pelos curdos e apoiadas pelos EUA dominam o nordeste.

Até agora, no entanto, outros rebeldes parecem estar acatando as diretrizes da coalizão principal para preservar as instituições estatais e evitar saques e atos de vingança.

"Você precisa apresentar o máximo de continuidade possível para evitar o que aconteceu em outros lugares", disse Drevon. "A segurança é uma questão muito, muito importante, porque, à medida que as pessoas começam a lutar, as armas começam a se espalhar, tudo desaba a partir daí."

Havia sinais de que os burocratas de Assad estavam aceitando seus novos líderes. Um dia após o Ministério das Relações Exteriores da Síria dizer em uma declaração que as embaixadas no exterior continuariam a fornecer serviços aos cidadãos sírios, a Embaixada Síria na Rússia levantou a bandeira verde dos rebeldes sobre sua representação no centro de Moscou na manhã desta segunda, de acordo com imagens de notícias.

Mas além de restaurar a ordem, a nova liderança deve enfrentar questões assustadoras sobre o futuro sistema político da Síria. Nesta segunda, ativistas da oposição síria que estavam no exílio há anos também estavam começando a retornar ao país, esperando moldar a transição em andamento.

Mouaz Moustafa, diretor executivo da Força-Tarefa de Emergência Síria, sediada nos Estados Unidos, disse que estava em contato regular com altos oficiais rebeldes desde antes do início da ofensiva. Ele acrescentou que os havia instado a continuar protegendo as minorias sírias e a restaurar rapidamente os serviços públicos que eram escassos sob o governo anterior, como eletricidade e água.

Ele estava a caminho de Damasco, onde disse que planejava se reunir com a nova liderança e outros membros da oposição que estavam retornando para traçar um rumo a seguir. "Todos são bem-vindos na conversa sobre o futuro da Síria", ele disse, acrescentando sobre os rebeldes, "Eles são muito abertos. Todos estão dispostos a ouvir, e tem sido realmente revigorante ver isso."

Cheio de otimismo, ele acrescentou: "A Síria está mais perto de ser uma democracia do que qualquer outra nação árabe".

Reconhecimento internacional

Ainda assim, não ficou imediatamente claro se muitos governos estrangeiros reconheceriam em breve o governo de transição, um passo que aumentaria a legitimidade dos rebeldes e que ajudaria a desbloquear mais ajuda humanitária internacional. Muitos países, incluindo os Estados Unidos, designam Hayat Tahrir al-Sham como uma organização terrorista e não tiveram contatos formais com o grupo.

Um ministro britânico disse à BBC que o Reino Unido estava considerando riscar o grupo de sua lista de grupos terroristas proibidos, o primeiro passo em direção a um relacionamento direto. Drevon disse que a França também fez propostas aos rebeldes. O New York Times relatou no domingo que o governo Biden também está avaliando o quanto se envolver com Damasco.

Essas movimentações provavelmente expandiriam a influência da Turquia, que há muito tempo mantém laços com Hayat Tahrir al-Sham e apoia abertamente outras facções rebeldes sírias. Agora, ela está emergindo como uma intermediária crucial para os rebeldes e as potências externas.

O ministro das Relações Exteriores da Turquia, Hakan Fidan, disse em um discurso televisionado a diplomatas em Ancara que a Turquia estava em contato com todas as partes.

"A nova administração deve ser estabelecida de forma ordenada", disse ele em comentários no domingo, delineando princípios que ele disse que a Turquia quer que sejam respeitados na Síria. "O princípio da inclusão nunca deve ser comprometido. Nunca deve haver um desejo de vingança. É hora de unir e reconstruir o país."

Fidan também pediu aos novos líderes da Síria que protejam quaisquer estoques de armas químicas que tenham sobrado do regime de Assad, preservem as instituições estatais e garantam tratamento igualitário às minorias sírias, incluindo cristãos, não árabes e curdos.

Os países ocidentais provavelmente exigirão condições semelhantes em troca da retirada da designação de terrorismo do Hayat Tahrir al-Sham e da concessão ao grupo da legitimidade internacional que ele tanto almeja, disse Drevon.

Entre os governos árabes, a maioria dos quais vê os grupos islâmicos com extrema cautela e há muito tempo se resignou a trabalhar com Assad, o clima parecia ainda mais cauteloso.

"Vimos países na região caírem em um abismo profundo após momentos temporários de júbilo", disse Tamim Khallaf, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Egito, na segunda-feira. "O Egito continuará a trabalhar com parceiros regionais e internacionais para ajudar a Síria durante esta fase delicada de sua história." (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)

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O uso da Lei Magnitsky contra uma autoridade de um país democrático é inédito. Até o momento, a norma só havia sido aplicada contra violadores graves dos direitos humanos, como autoridades de regimes ditatoriais, integrantes de grupos terroristas e criminosos ligados a esquemas de lavagem de dinheiro e de assassinatos em série.

O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, Paulo Azi (União-BA), espera que o julgamento da cassação da deputada federal licenciada Carla Zambelli (PL-SP) ocorra entre agosto e setembro.

O prazo exato dependerá do relator do caso, deputado Diego Garcia (Republicanos-PR), segundo o próprio Azi.

Como relator, Garcia pode pedir que sejam ouvidas testemunhas no caso. A defesa de Zambelli, que pediu o arquivamento da representação, indicou que, se a situação avançar, seria "imperiosa" a oitiva do hacker Walter Delgatti Neto, delator que acusou Zambelli de ter invadido o sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

A parlamentar foi condenada a dez anos de prisão por esse episódio.

Garcia tem até cinco sessões para apresentar o parecer, que dependem do número de sessões plenárias realizadas. A Câmara está em recesso e volta apenas na próxima semana. Procurado, Garcia não respondeu aos contatos reportagem.

A defesa também pede as oitivas do general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, ex-ministro da Defesa que se encontrou com Delgatti; de Michel Spiero, assistente técnico da defesa; do delegado Flávio Vieitez Reis, responsável pelo inquérito, e do policial federal Felipe Monteiro de Andrade, que fundamentou as acusações a Zambelli.

"A efetivação dessas oitivas não é apenas um direito da defesa; é uma condição para a legitimidade e a imparcialidade do processo conduzido por esta comissão", diz Fábio Pagnozzi, advogado da deputada licenciada.

Nesta terça-feira, 29, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), disse que a Casa está adotando as providências possíveis sobre o mandato parlamentar, que tramita na CCJ. "Não cabe à Casa deliberar sobre a prisão - apenas sobre a perda de mandato", disse.

O processo na CCJ foi aberto por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF).

Após a votação na CCJ, caberá ao plenário decidir se cassará Zambelli. São necessários 257 votos para isso.

Zambelli está foragida na Itália, país que tem cidadania, e é alvo de uma mandado de prisão de autoria do ministro Alexandre de Moraes.

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Ao contrário do secretário do Tesouro, Scott Bessent, a nota de Rubio não traz menção direta ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

Contudo, Rubio acusa Moraes de "engajar em esforços politicamente motivados para silenciar uma crise política ao emitir ordens secretas compelindo plataformas online, incluindo redes sociais dos EUA, a banir contas de indivíduos por postarem discurso protegido".

Segundo ele, Moraes fez detenções arbitrárias com "negação flagrante de garantias de um julgamento justo".

Rubio citou as sanções aprovadas pelo Tesouro contra o juiz brasileiro e disse que os EUA "vão utilizar todos os meios apropriados, efetivos, diplomáticos, políticos e legais para proteger o discurso de americanos contra atores estrangeiros malignos".

Em publicação separada, no X, o secretário de Estado afirmou que este é um "aviso". "Que este seja um aviso para aqueles que pisotearam em direitos fundamentais dos seus compatriotas: vestes judiciais não poderão protegê-lo", escreveu.