O retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos deve ser seguido da retomada de políticas linha-dura contra o regime de Nicolás Maduro na Venezuela, mas as chances de essa estratégia provocar mudanças na ditadura são pequenas, de acordo com analistas. Caracterizadas no primeiro mandato de Trump por sanções econômicas e apoio aberto à oposição, a pressão trumpista agravou a crise econômica sem tirar Maduro do poder. Desta vez, o chavismo está mais preparado para resistir à pressão em virtude dos vínculos com Rússia e China.
Na análise do professor de política internacional da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) Paulo Velasco, nos últimos sete anos Maduro conseguiu aumentar vínculos com economias fortes, como a China, e com países com posições opostas dos EUA, como Rússia e Irã. "Apesar do isolamento na região, é uma Venezuela mais confortável por laços com China, Rússia, Turquia, Irã. Esses são atores que dão um lastro ao governo do Maduro", disse Velasco.
Além dos laços para se blindar dos EUA, Maduro aprendeu a contornar as sanções, o que amplia a dúvida crescente sobre a eficácia delas. Utilizadas amplamente pelos EUA, elas foram ineficazes para mudar os rumos da política de Moscou, de Teerã e do próprio regime bolivariano - três governos que são alvos frequentes de Washington - nos últimos anos. Em reação, os governantes têm aprendido a contorná-las. "O Irã ensina a Venezuela como contornar sanções econômicas, são especialistas nisso", acrescentou o professor.
Em seu primeiro mandato como presidente americano, Trump impôs medidas contra Maduro que impossibilitaram a venda do petróleo produzido no país e bloquearam transações econômicas entre Washington e Caracas. Foram 46 sanções só em 2018, ano em que as eleições na Venezuela tiveram suspeitas de fraude. A quantidade representa mais do que o dobro de todas as sanções do governo Obama contra Caracas, segundo a organização Center for a New American Security (CNAS).
As medidas do republicano incluíram a proibição de transações com títulos da dívida venezuelana e com a petrolífera estatal PDVSA e a restrição ao acesso do governo venezuelano a mercados financeiros. O objetivo era cortar o fluxo de recursos que sustenta o regime para forçar uma mudança política.
A crise econômica que o país já enfrentava se agravou e aumentou o fluxo de migrantes venezuelanos para os EUA - e acabou por piorar o problema antigo dos EUA no sistema imigratório. "Trump não deve mudar a política por causa disso. O problema da migração ele deve tratar pressionando os países da América Central a impedir que essas pessoas cheguem na fronteira dos EUA", avaliou Maurício Santoro, cientista político e colaborador do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha.
Para Santoro, as falhas no objetivo das primeiras sanções não devem inibir Trump de adotá-las novamente. Ao contrário, a escolha de Marco Rubio, filho de cubanos e crítico ferrenho dos regimes de Cuba e Venezuela, para chefiar a diplomacia dos EUA como secretário de Estado indica uma atenção maior à América Latina e a continuação de políticas linha-dura. "Não espero nada diferente", disse Santoro.
Apoio à oposição
Além das sanções, Trump também deve dar um apoio retórico mais frequente à oposição venezuelana, hoje mais ligada a María Corina Machado. No último dia 9, quando ela alegou ter sido detida depois de uma manifestação contra o regime venezuelano, Trump prestou apoio nas redes sociais à líder política. Para os analistas, no entanto, trata-se de um apoio sem efeitos práticos para a situação da Venezuela.
Para a venezuelana e professora de Ciência Política e Relações Internacionais do Valencia College da Flórida, María Isabel Puerta Riera, nenhuma dessas ações, seja apoio retórico ou sanções, devem causar uma mudança no regime venezuelano, que se sustenta no apoio dos militares e da polícia nacional a Maduro. "Essas ações não têm a capacidade de influir sobre o regime. É preciso que haja um conjunto delas, de pressão, sanções e ações do sistema de justiça, que cause uma fratura", afirmou.
Puerta Riera avalia ainda que a oposição venezuelana hoje possui mais legitimidade do que em 2018, ano em que o então presidente da Assembleia Nacional, Juan Guaidó, se autoproclamou presidente. O venezuelano também recebeu apoio do exterior, com o primeiro governo Trump e nações europeias reconhecendo a sua presidência, mas tinha menos respaldo interno. "As situações de María Corina e Guaidó são diferentes. María Corina foi escolhida como líder da oposição nas primárias, enquanto Guaidó era apenas um membro da Assembleia Venezuelana", declarou a analista.
As situações de Guaidó e do grupo de María Corina também são diferentes no exterior. Com a proibição da candidatura da opositora e as evidências de fraude na eleição que Maduro disputou com Edmundo González Urrutia, substituto de Corina, houve críticas à Venezuela até mesmo entre governos que possuíam boas relações com Caracas. Esse é o caso do Brasil, da Colômbia e do México, que não reconheceram a eleição.
Na avaliação de Maurício Santoro, o fato da oposição denunciar a fraude eleitoral, incluindo visitas a diversos países para mostrar as evidências, também aumenta a simpatia dos governos a María Corina e Edmundo González. "O apoio atual que o Maduro tem do ponto de vista diplomático é pequeno", disse. "Não é insignificante, porque ajuda o Maduro a se manter no poder, mas é uma legitimidade muito menor que no passado, na época do (Hugo) Chávez", acrescentou Santoro.
O poder futuro dessa mobilização, no entanto, é ameaçado por uma repressão cada vez pior de Maduro contra a oposição. Edmundo González Urrutia, que havia prometido retornar a Venezuela, está sob ordem de prisão. Milhares de pessoas que foram às ruas para protestar contra as eleições do ano passado foram presas. Como em anos anteriores, dizem os analistas, o sufocamento dos opositores podem dar sobrevivência à ditadura.
Provável aposta de Trump em linha-dura contra Maduro deve fracassar, dizem analistas
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