Por que os brasileiros continuam presos em Gaza? Diplomatas comentam negociação

Internacional
Tipografia
  • Pequenina Pequena Media Grande Gigante
  • Padrão Helvetica Segoe Georgia Times
Passado um mês desde o início da guerra de Israel contra o grupo terrorista Hamas, brasileiros continuam presos na Faixa de Gaza e relatam dificuldade para encontrar itens básicos, como água e alimentos. O governo tem dito que está em negociação constante para repatriar o grupo de 34 pessoas, mas sem sucesso até agora: os brasileiros estavam fora de todas as listas de estrangeiros autorizados a seguir para o Egito pela passagem de Rafah até esta segunda-feira, 6.

Israel já disse ao Brasil que a liberação deve sair até a quarta-feira, 8, compromisso que voltou a ser relatado pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, em reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na manhã de hoje. Até agora, a ampla maioria dos estrangeiros que passaram pelo posto de Rafah é composta por americanos e europeus, principalmente britânicos, franceses e alemães.

Até agora, no entanto, Israel e Egito não tornaram públicos os critérios adotados para escolha dos 1.400 estrangeiros contemplados nas primeiras listas. Após o acordo, selado na semana passada por intermediação do Catar e dos EUA, cerca de 500 pessoas por dia deixaram Gaza até o fim de semana, quando o processo foi interrompido, depois de suspeitas de que o Hamas embutia combatentes feridos entre os palestinos que deixavam Gaza para atendimento médico no Egito. As saídas foram retomadas nesta segunda-feira.

O embaixador do Brasil em Israel, Frederico Meyer, destacou a complexidade do processo diante do número de pessoas que tenta sair do enclave em guerra e rejeitou as especulações de que a relação do Brasil com Israel possa ter influenciado. "Não é uma questão de relação bilateral", disse ele ao citar como exemplo a Indonésia que não reconhece o Estado de Israel e foi contemplada na primeira lista.

O diplomata de carreira Rubens Ricupero, ex-embaixador brasileiro em Washington, que acompanha à distância, sem envolvimento na negociação, também diz não ver indícios de retaliação. "O Brasil não tem uma postura que se destaque pela agressividade", apontou Ricupero.

A tese também foi rechaçada ainda pelo embaixador israelense no Brasil, Daniel Zohar: "Israel não está decidindo quem será incluso na lista, não estamos impedindo ninguém de sair", disse ele ao apontar a responsabilidade do grupo terrorista Hamas, que controla Gaza. "O Hamas está impondo diversas condições para liberar a saída dos palestinos com dupla nacionalidade e isso está prejudicando a saída", enfatizou.

Na mesma linha, a embaixada de Israel, em sua posição oficial, aponta o Hamas e afirma que tem feito "absolutamente tudo que está ao seu alcance para que todos os estrangeiros deixem a Faixa de Gaza o mais rápido possível". Ainda de acordo com a representação diplomática de Tel-Aviv em Brasília, qualquer informação diferente disso "está errada ou é fruto de desinformação".

A ideia de que a posição brasileira teria atrasado a retirada de brasileiros se espalhou pelas redes sociais nos últimos dias, alimentada pela esquerda e pela direita. Isso porque, no momento em que Israel declarou guerra aos terroristas do Hamas, o Brasil ocupava a presidência temporária do Conselho de Segurança da ONU e insistiu para aprovar a resolução que previa pausas humanitárias no conflito. Mais uma vez, sem sucesso. O texto foi vetado pelos Estados Unidos porque, segundo a diplomacia americana, não mencionava o direito de defesa israelense.

A tese de que o Brasil teria sido deixado para depois foi reforçada por um diplomata de carreira, que pediu para não ser identificado. "O governo superestimou a capacidade do Brasil quando estava no Conselho de Segurança, não só na tentativa de aprovar as resoluções, mas também quando achou que tinha peso para liberar os brasileiros assim que a passagem de Rafah foi aberta para estrangeiros", disse.

A fonte aponta que além do "erro de avaliação sobre a capacidade de influência brasileira no processo", algumas declarações podem ter atrapalhado. Esse seria o caso, por exemplo, do discurso em que o presidente Lula chamou a resposta israelense ao ataque terrorista do Hamas de "insana".

"Fico lembrando que 1500 crianças já morreram na Faixa de Gaza, 1500 crianças que não pediram para o Hamas fazer o ato de loucura que fez, de terrorismo, atacando Israel. Mas também não pediram para que Israel reagisse de forma insana e matasse eles", declarou o presidente no mês passado.

Essa mesma fonte acredita que falas como essa foram interpretadas por Tel-Aviv como contrárias a Israel, que pode não admitir isso publicamente mas estaria "dando um troco no Brasil".

O embaixador do Brasil em Ramallah, Alessandro Candeas, não respondeu ao pedido de entrevista para esta reportagem. Mais cedo, ele confirmou ao Estadão que a passagem de Rafah foi reaberta e que os brasileiros ainda esperam por autorização para cruzar a fronteira. (COLABOROU DANIEL GATENO)

Em outra categoria

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta sexta-feira, 14, manter a suspensão da rede social Rumble no Brasil. A Primeira Turma da Corte acompanhou o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes, que determinou o bloqueio da plataforma de vídeos no país.

Moraes suspendeu a Rumble após a empresa descumprir a determinação judicial que exigia da empresa a indicação de um representante legal no Brasil, o que não ocorreu. O bloqueio é por tempo indeterminado e permanecerá em vigor até que a plataforma cumpra a determinação e pague as multas estipuladas. Os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin e Flávio Dino votaram para manter a decisão de Moraes.

O embate entre o ministro e a Rumble teve início após a plataforma se recusar a bloquear o perfil do blogueiro Allan dos Santos, que está foragido das autoridades brasileiras. Investigado por disseminação de fake news e ataques a integrantes do STF, Santos já teve seus perfis suspensos em outras redes sociais.

O CEO da Rumble, Chris Pavlovski, reagiu à decisão no X (antigo Twitter), afirmando que não acataria a ordem judicial. "Em vez disso, nos veremos no tribunal. Atenciosamente, Chris Pavlovski", publicou.

O comentário faz referência a uma ação movida pelo Rumble e pela Trump Media - empresa ligada ao ex-presidente Donald Trump - contra Moraes nos Estados Unidos, que acusam o ministro de violar a soberania americana.

Na decisão que determinou o bloqueio da plataforma, Moraes criticou a postura de Pavlovski, afirmando que o empresário "confunde liberdade de expressão com uma inexistente liberdade de agressão, confunde deliberadamente censura com proibição constitucional ao discurso de ódio e de incitação a atos antidemocráticos".

O ministro também ressaltou que redes sociais não podem ser usadas como "escudo" para justificar atividades ilícitas.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, arquivou todas as denúncias feitas pela oposição contra Rosângela da Silva, a Janja, que questionavam e pediam investigações sobre os gastos da primeira-dama em viagens internacionais. A informação foi publicada pela Folha de S. Paulo e confirmada pelo Estadão.

"As representações oferecidas não expõem elementos de desvio de recursos públicos, mas juízos de inconformismo com custos de atividades, ao que se nota, tornados públicos, como devido. Não se tem aqui tema de legalidade apurável no âmbito da competência do Ministério Público", diz trecho da decisão publicada pelo jornal.

Gonet afirmou ainda que a participação de Janja nos eventos oficiais é prevista e que o presidente da República pode delegar ao cônjuge esse tipo de ato protocolar, quando propiciarem "melhores resultados diplomáticos".

O procurador-geral da República citou como exemplo a mulher do ex-presidente Getúlio Vargas, afirmando que não há novidade na atuação de Janja. "É inegável, além disso, a consolidação da tradição no Brasil e em outros tantos países do papel social desempenhado pelas suas assim chamadas primeiras-damas. Entre nós, lembre-se, a mero título exemplificativo, de Darcy Vargas, mulher do presidente Getúlio Vargas, a quem se liga a criação e a direção da Legião Brasileira de Assistência (LBA), de fins assistenciais", escreveu.

Como mostrou o Estadão, parlamentares de oposição ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acionaram tanto a Controladoria-Geral da União (CGU) quanto o Tribunal de Contas da União (TCU) para que investigassem as viagens internacionais de Janja, com passagens na classe executiva.

Em fevereiro, a primeira-dama esteve em Roma, na Itália, onde participou de eventos do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida) e se encontrou com o Papa Francisco. As passagens de ida e volta da primeira-dama custaram R$ 34,1 mil.

Janja costuma ser alvo de críticas tanto pelas viagens internacionais representando o Brasil, como por não ter um cargo formal no governo, mas utilizar estrutura e verbas públicas. Como mostrou o Estadão, o "gabinete informal" gerido pela primeira-dama tem pelo menos 12 integrantes, e já gastou ao menos R$ 1,2 milhão em viagens desde o começo do terceiro mandato de Lula.

As críticas provocaram mudanças no comportamento da primeira-dama, como, por exemplo, passar a divulgar seus compromissos nas redes sociais. Janja também desistiu de viajar a Nova York, nesta semana, para chefiar a delegação brasileira e discursar representando o Brasil na Organização das Nações Unidas (ONU).

O Tribunal de Contas da União (TCU) abriu cinco auditorias nos comitês de cultura criados pelo governo federal após suspeitas de uso político e eleitoral das estruturas pelo partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). As representações foram protocoladas por parlamentares da oposição ao governo no Congresso e tramitam sob a relatoria do ministro Augusto Nardes.

Em paralelo, os congressistas preparam um pacote de medidas para pressionar a pasta da ministra Margareth Menezes. Como revelou o Estadão, os comitês estão ligados a ações partidárias e eleitorais, embora tenham sido criados no âmbito de uma política pública que vai custar R$ 59 milhões em dois anos.

Puxados por integrantes do PL, os integrantes da oposição discutem convocação da ministra da Cultura, a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e a criação de uma comissão externa para acompanhar o caso.

O líder da oposição na Câmara, deputado Luciano Zucco (PL-RS), considera inadmissível o governo utilizar o aparato estatal para promover agendas ideológicas específicas.

"Tal prática fere os princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa previstos na Constituição Federal. Enquanto isso, os verdadeiros artistas e produtores culturais do Brasil estão sendo excluídos de políticas públicas que poderiam fomentar a arte e a geração de empregos no setor cultural", disse.

Para além das possíveis criações de comissões, opositores realizaram uma série de pedidos de informações ao Ministério da Cultura em busca de esclarecimentos e como forma de pressão sobre a pasta. O deputado Kim Kataguiri (União-SP) já pediu a abertura de uma investigação pela Procuradoria-Geral da República.

"Caso essa grave situação seja confirmada, configura-se um potencial desvio de finalidade e a utilização indevida de recursos públicos, em afronta aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, bem como às normas da legislação eleitoral, que vedam expressamente o emprego de verbas públicas em campanhas eleitorais", destacou a senadora Damares Alves (Republicanos-DF).

Em nota, o Ministério da Cultura informou que não existe impedimento a ONGs dirigidas por militantes partidários, "desde que não envolvam membros de Poder ou servidores públicos responsáveis pelo edital". A pasta também acrescentou que o "modelo do PNCC fortalece o controle social e a fiscalização cidadã, afastando riscos de instrumentalização partidária".

No TCU, os processos de auditoria abertos foram iniciativas do senador Rogério Marinho (PL-RN) e dos deputados Carlos Jordy (PL-RJ), Carla Zambelli (PL-SP), delegado Caveira (PL-PA) e Ubiratan Sanderson (PL-RS).