Blitz conservadora de Milei surpreende diplomacia de Lula

Internacional
Tipografia
  • Pequenina Pequena Media Grande Gigante
  • Padrão Helvetica Segoe Georgia Times
Os embates políticos que marcaram a cúpula do Mercosul prenunciam tempos difíceis para o governo Luiz Inácio Lula da Silva e os esforços de impulsionar o bloco. A reunião de presidentes explicitou a blitz conservadora de Javier Milei na diplomacia argentina. O governo brasileiro saiu de Assunção, no Paraguai, surpreendido com a posição argentina e preocupado com o futuro do principal bloco de que faz parte, em aspectos políticos e econômicos.

Milei não compareceu à reunião após novo entrevero com Lula. Ele negou uma relação causa e efeito. Inegável, porém, é que essa decisão esvaziou a cúpula.

Se o boicote de Milei, por um lado, adiou um potencial mal-estar com Lula, por outro, não minimizou os impactos de sua agenda liberal e conservadora. Milei não saiu na foto, mas fez sombra ao Mercosul. Pautou e travou discussões. A troca de governo na Casa Rosada, afinal, ainda era novidade no Mercosul.

A ausência de Milei foi mal recebida por rivais e colegas do argentino, por ser um sinal de falta de prioridade. Havia desconfiança com as bravatas do libertário, que ameaçou retirar o país do bloco.

Lula disse que "quem perdeu foi quem não veio" e classificou a ausência como "bobagem imensa" do argentino. O presidente do Paraguai, Santiago Peña, fracassou na tentativa de aproximar os líderes das principais economias do bloco. Ao Estadão, disse que não vai desistir.

O presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou, vai capitanear o Mercosul no segundo semestre. Coube a ele dar o recado mais direto contra a posição dúbia de Milei. Ele afirmou que não importa somente o teor da mensagem, mas também quem é o mensageiro.

Representante

Em vez de estrear, Milei enviou como porta-voz a chanceler argentina, Diana Mondino. Ela anda desprestigiada no próprio governo e atualmente representa o país onde o presidente não quer ir. Mondino assegurou a permanência no bloco, sem inspirar muita confiança. Propôs uma "atualização" do Mercosul, uma agenda reformista para, segundo ela, dinamizar o bloco.

Ela escolheu o termo italiano aggiornamento para se referir à reforma do bloco apresentada por ela que inclui, entre outros, a "flexibilidade" para que cada país membro do Mercosul possa negociar a seu tempo, e no formato país a país, os acordos comerciais.

Essa proposta altera uma regra fundamental do bloco, a negociação em conjunto pelos membros dos acordos de livre comércio - e não de forma bilateral. De olho em se beneficiar na relação com a China, o Uruguai já perseguia essa mudança e se disse satisfeito. Brasil e Paraguai não, o que impediu que a sugestão de liberar negociações comerciais bilaterais constasse no comunicado conjunto, como pretendia Mondino.

Comunicados

Se em público a Argentina defendeu a "atualização" do bloco, nos bastidores a tropa enviada por Milei foi apontada como o ator que sabotou os comunicados do Mercosul e apresentou uma agenda "retrógrada", ao menos aos olhos de Brasília. Barravam assuntos por viés ideológico, ao mesmo tempo que pleiteavam inserir temas de interesse exclusivo da Argentina, relatou um embaixador diretamente envolvido.

O Mercosul negociou a publicação de três documentos. Em reuniões multilaterais como essas, os comunicados são a palavra final do bloco.

O principal deles é o Comunicado dos Estados Parte e da Bolívia - que formalizou sua adesão. O texto saiu, mas ficou bastante desidratado e genérico, por causa de imposições de viés ideológico e diferenças políticas e comerciais.

Um segundo, chamado de Comunicado dos Estados Parte e Associados, pela primeira vez naufragou por divergências puramente políticas.

A principal delas era a sugestão boliviana, apoiada pelo Brasil, de incluir uma menção textual à "tentativa de golpe de Estado" na Bolívia. Os argentinos se insurgiram.

O mesmo impasse se repetiu na negociação do documento principal, que seria assinado pelos presidentes. O Itamaraty entrou em cena e disse que Lula não iria transigir. Deveria sair ao menos uma referência ao assunto, porque o Brasil também havia sido alvo de atentados golpistas no 8 de janeiro de 2023.

Ao fim, a menção à quartelada na Bolívia foi atenuada e deixou de contar com uma mensagem de solidariedade a Arce.

O comportamento dos argentinos foi descrito por embaixadores como o de um governo na sala do VAR (sistema de assistência de vídeo no futebol) e não em campo. Em vez de buscar construir consensos, o que pressupões flexibilidade para ceder, converteu-se em "árbitro" moral do que deveria ou não constar nos comunicados e na agenda do Mercosul.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Em outra categoria

A vereadora Cris Monteiro (Novo) afirmou nesta terça-feira, 29, durante discurso na tribuna da Câmara Municipal de São Paulo, que "mulher branca, bonita e rica incomoda". A declaração foi dirigida a sindicalistas que acompanhavam a votação do reajuste dos servidores municipais e gerou forte reação da plateia e de parlamentares.

Durante sua fala, Cris repreendeu a vereadora Luana Alves (PSOL), que tentava confrontá-la, e disse: "Por favor, Luana, calada. Pode me devolver o tempo. Eu escutei todos vocês calados (...) Agora, quando vem uma mulher branca aqui, falar a verdade para vocês, vocês ficam todos nervosos. Porque uma mulher branca, bonita e rica incomoda muito vocês".

Ela completou dizendo que representa uma parcela da população que a elegeu e criticou os grevistas. "Eu não vou defender essas pessoas que deixam as nossas crianças na sala de aula fazendo greve."

A vereadora Luana Alves, que é negra, classificou a fala como racista e pediu a suspensão da sessão. Segundo ela, Cris Monteiro teria direcionado suas palavras diretamente a ela enquanto discursava.

O áudio da transmissão oficial da sessão pela Rede Câmara, canal da Casa no YouTube, chegou a ser interrompido por alguns minutos, mas foi restabelecido em seguida. Após o retorno, a vereadora do Novo pediu desculpas.

"Lamento profundamente se alguém em particular se sentiu ofendido com a minha fala, não foi minha intenção. Faço uso da tribuna, como qualquer parlamentar, para defender minhas ideias e falar o que penso".

O presidente da Câmara, Ricardo Teixeira (União), disse que a Casa "não permite racista" e mencionou o caso do ex-vereador Camilo Cristófaro (Avante), cassado em 2023 por fala racista. No entanto, após rever o vídeo da declaração de Cris, avaliou que não houve racismo.

"Nós vimos e revimos várias vezes o vídeo. Na nossa opinião, não houve racismo", afirmou o presidente da Câmara. Segundo ele, a Corregedoria da Câmara acompanhará o caso. "Esse fato será analisado com sangue tranquilo, temperatura normal, pressão também".

A vereadora do PSOL, no entanto, reforçou a acusação. Para ela e outros vereadores, se tratou de um ato de racismo evidente.

"A vereadora Cris irá responder na Corregedoria. Fico muito triste que uma cassação não tenha sido suficiente para aprenderem que não se pode desrespeitar a população negra nessa Câmara", disse. Ela espera que o desfecho seja semelhante ao do caso Cristófaro.

Essa não foi a primeira polêmica envolvendo a vereadora Cris Monteiro. Em 2021, ela se envolveu em um episódio de agressão com a então vereadora Janaína Lima, à época também filiada ao Novo. Na ocasião, Cris afirmou esperar que Janaína fosse cassada.

Um relatório da Corregedoria da Câmara Municipal recomendou a suspensão das funções legislativas de ambas - Janaína e Cris - após a briga ocorrida no banheiro ao lado do Plenário, durante a votação da reforma da Previdência. No entanto, a ação disciplinar não avançou.

O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, afirmou a jornalistas, nesta terça-feira, 29, que está "totalmente" descartada a possibilidade de seu afastamento do ministério. As declarações ocorreram após depoimento na Comissão de Previdência da Câmara dos Deputados.

Na ocasião, Lupi havia respondido questionamentos de parlamentares sobre as fraudes no Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). Ao ser questionado se houve alguma conversa sobre o seu afastamento do ministério, Lupi respondeu "nenhuma". Ele acrescentou: "Quem tem que decidir sobre isso é o presidente Lula. Eu sei que eu tenho a confiança dele e estou trabalhando para elucidar tudo o que tiver de errado", declarou.

Lupi voltou a dizer que não houve demora nas providências ao tomar conhecimento das denúncias de fraudes no INSS. "Isso é uma formação de quadrilha: grupos que se montaram para criar instituições e para roubar dinheiro de aposentado. Isso é chocante para mim", declarou.

O ministro prosseguiu: "Eu fui surpreendido com o volume disto. Porque eu sabia que tinha uma denúncia aqui, outra acolá, a gente sempre soube, a gente recebia queixa, na própria plataforma do INSS aparecia algumas pessoas se queixando. Agora, nesse quantitativo, por uma organização, eu tomei conhecimento agora".

Lupi também argumentou que a base para as investigações da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União (CGU) vieram de apurações que ele determinou no INSS. Questionado se houve demora nas providências, ele negou.

"Aí, é outra discussão. Quando eu fiz a comparação com o botequim da esquina, eu adoro um pão na chapa no botequim da esquina. Quando eu fiz a comparação, é no sentido de que isso não é simples, são 7 milhões de pessoas. Como é que você verifica, checa, cria biometria de 7 milhões de pessoas?", afirmou.

Ainda em resposta aos jornalistas, Lupi afirmou: "Não demorei a determinar (as apurações). Foi tomado conhecimento dos vários fatos, inclusive no Conselho. O Conselho não é executivo, é um conselho de debate, de deliberações macro sobre visão da Previdência Social. Estava lá no assento o presidente do INSS e o diretor do INSS. Eu pedi para que tomassem providências disso, tanto é que eu demiti o diretor".

Conforme mostrou o Broadcast Político (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado), Lupi argumenta que demitiu o diretor de Benefícios André Félix Fidélis, que teria apresentado lentidão para avançar com as apurações. Uma reportagem do Jornal Nacional, da TV Globo, mostrou que o ministro foi alertado sobre as fraudes em junho de 2023, mas adiou a discussão e só tomou providências após quase um ano.

A auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) nos descontos em contracheques de aposentados e pensionistas do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) revelou situações flagrantes de fraude.

Foram descobertos cadastros em nome de analfabetos, indígenas de comunidades isoladas, idosos com doenças graves, pessoas com deficiência e aposentados.

São pessoas que, segundo a CGU, não teriam como comparecer pessoalmente às associações e nem como assinar fichas de filiação e termos de autorização para os descontos em benefício dessas entidades. Algumas até residem no exterior.

Os casos foram descobertos a partir de entrevistas feitas com uma amostra de 1.273 beneficiários do INSS, registrados nos 27 Estados e no Distrito Federal, que tiveram valores descontados de seus contracheques. 97,6% dos entrevistados informaram à CGU não ter autorizado os abatimentos.

Os beneficiários do INSS podem aderir a associações civis e sindicatos e autorizar descontos mensais em seus contracheques para cobrir custos de filiação. Para isso, as entidades devem estar habilitadas junto ao INSS e precisam receber autorização "prévia, pessoal e específica" de aposentados e pensionistas interessados.

Parte dos aposentados ouvidos pela CGU só tomou conhecimento dos descontos no momento das entrevistas.

A Polícia Federal afirma que a auditoria revela um "cenário de incongruências". A PF investiga se idosos foram induzidos a assinar autorizações de desconto sem saber a verdadeira finalidade dos documentos e até se assinaturas foram forjadas.

As suspeitas são investigadas na Operação Sem Desconto. Segundo a Polícia Federal, servidores do INSS venderam dados de aposentados e pensionistas em troca de propinas e facilitaram os descontos indevidos direto nos contracheques dos beneficiários. O esquema teria causado um prejuízo de R$ 6,3 bilhões a milhares de aposentados.

Pressionado, o presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, pediu demissão após ter sido afastado do cargo por ordem judicial.