O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), divergiu da maioria já formada nesta quarta, 25, no julgamento sobre a responsabilidade das plataformas digitais, redes sociais e provedores de internet por publicações de usuários.
Fachin ponderou sobre os riscos e benefícios de punir as plataformas por conteúdos publicados por terceiros. Para o ministro, ampliar as obrigações das empresas de tecnologia ajudará a proteger direitos fundamentais, mas pode gerar "censura colateral", inclusive de jornalistas.
"A adoção de controle de discurso dos usuários não faz parte do estado de direito democrático", disse o ministro. "A necessidade de ordem judicial para se remover conteúdo por terceiro parece ser a única forma constitucionalmente adequada de compatibilizar a liberdade de expressão com regime de responsabilidade ulterior (posterior)."
O placar está em 8 a 2 para ampliar a obrigação das empresas na moderação de conteúdo. Resta apenas o voto do ministro Kassio Nunes Marques.
Fachin argumentou que a tecnologia está em "incessante mutação" e que o julgamento do STF sobre a moderação de conteúdo não será suficiente para resolver os problemas gerados pela concentração de poder nas mãos das plataformas. "Corremos o risco de não conseguir ajustar o remédio pela falta de um completo diagnóstico."
Congresso
O ministro defendeu que a regulamentação seja feita pelo Congresso, com a edição de uma legislação abrangente. "Não creio que este tema necessariamente será solvido ou esgotado com a remoção ou não de conteúdos das plataformas. Creio que há uma necessidade de uma regulação estrutural e sistêmica, preferencialmente não via Poder Judiciário."
Depois de Fachin, votou a ministra Cármen Lúcia, que acompanhou a maioria para ampliar as responsabilidades das plataformas. "Quando se tem anúncio, impulsionamento, monetização, não são neutras as plataformas. Elas não são apenas prateleiras nas quais se deposita algo que elas não têm conhecimento do que seja", argumentou a ministra.
Artigo 19
O julgamento gira em torno do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que proíbe a responsabilização das plataformas por conteúdos publicados pelos usuários, exceto se houver descumprimento de decisões judiciais para remover as postagens.
Há maioria de votos para criar novos parâmetros de atuação das big techs. Os ministros apresentaram propostas diferentes e o plenário precisa equilibrá-las em uma tese para ser aplicada nacionalmente pelo Poder Judiciário, o que só deve ocorrer no segundo semestre. O julgamento é considerado internamente o mais importante da história recente do STF.
A maioria entende que houve uma "desconstitucionalização" do artigo 19, ou seja, a norma era adequada no momento em que foi aprovada, em 2004, mas, hoje, não é mais suficiente para resguardar os usuários no ambiente virtual em um contexto de escalada de casos de violência digital, com cyberbullying, stalking, fraudes e golpes online, discurso de ódio e fake news.
Os principais pontos de preocupação são a proteção de crianças e adolescentes, de minorias sociais e da democracia.
O assunto está no radar dos ministros há mais de dois anos. Havia expectativa de que o Congresso avançasse na regulamentação das redes, mas como o PL das Fake News ficou paralisado no Legislativo, após pressão das big techs, em 2023, o STF decidiu agir. Os ministros preferiram aguardar as eleições de 2024 para se debruçar sobre o tema fora do período eleitoral.
Uma ala da Câmara e do Senado acusa o tribunal de avançar sobre atribuições do Legislativo, mas os ministros acordaram que não era mais possível esperar o Congresso desengavetar a pauta. O debate ganhou força na Corte após o descumprimento de decisões judiciais por plataformas estrangeiras, como Telegram e X, que ofereceram resistência em nomear representantes legais no Brasil.
A expectativa é de que Nunes Marques vote mais alinhado a Fachin e Mendonça.
Posições
Relatores dos dois casos abordados no julgamento que colocou em xeque o artigo 19 do Marco Civil da Internet, Dias Toffoli e Luiz Fux defenderam punições para as empresas de tecnologia que não removerem publicações ofensivas (injúria, calúnia e difamação) imediatamente após a simples notificação dos usuários.
O presidente do Supremo, Luís Roberto Barroso, e os ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin e Gilmar Mendes consideraram que a exigência de ordem judicial para remoção desses conteúdos deve continuar a valer, desde que as empresas melhorem seus sistemas internos de monitoramento.
Um dos maiores defensores da regulamentação, Alexandre de Moraes votou para equiparar legalmente provedores de redes sociais e serviços de mensagens, como WhatsApp, aos meios de comunicação tradicionais. Segundo ele, as big techs não podem ser "terra sem lei" nem operar com "imunidade territorial absoluta".
Os sete ministros, além de Cármen Lúcia, afirmaram que é dever das plataformas impedir espontaneamente a circulação de publicações criminosas. Há diferenças, no entanto, do rol de crimes definidos em cada voto.
Já André Mendonça votou para manter as regras como estão, além de defender que perfis inteiros não poderiam ser suspensos, apenas publicações específicas.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fachin defende regular big techs fora do STF e vê risco de 'censura colateral'
Tipografia
- Pequenina Pequena Media Grande Gigante
- Padrão Helvetica Segoe Georgia Times
- Modo de leitura