Morre Idibal Piveta, diretor de teatro, dramaturgo e advogado de presos políticos na ditadura

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Ele era mais conhecido como Cesar Vieira. Seu cavanhaque e talento para contar histórias cativavam as pessoas do teatro. Mas o diretor teatral premiado no Brasil (APCA), no festival de Nancy, na França, de teatro amador, além do Casa das Américas, em Cuba, dividia sua vida com outra paixão: a advocacia. Nela ele se apresentava com seu nome de nascença: Idibal Piveta. E foi com sua carteira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que ele defendeu gratuitamente centenas de presos políticos durante a ditadura militar (1964-1965). Na manhã desta segunda-feira, ele morreu em casa, em São Paulo.

Nascido em Jundiaí, em 1931, ele tinha 92 anos. Formado em Direito e em Jornalismo, também estudou na Escola de Artes Dramáticas (EAD), da Universidade de São Paulo. Sofria há meses com uma enfermidade que lhe tolheu os movimentos.

Em 1969, participou da fundação do grupo de teatro União e Olho Vivo em companhia de colegas do Centro Acadêmico 11 de Agosto, da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da Universidade de São Paulo. Era dele o primeiro texto encenado pelo grupo: O Evangelho Segundo Zebedeu, que tratava da história de Antonio Conselheiro e do conflito entre os jagunços e as tropas do governo. A peça foi dirigida por Silnei Siqueira.

O diretor de teatro Augusto Boal, de quem foi advogado, dizia que Vieira era o mais importante diretor de teatro amador do País. Em 1973, encenava a peça Rei Momo - a segunda de sua autoria -quando uma de suas atrizes contou que um conhecido seu havia sido preso pelo Exército. Tania Regina Mendes estava sendo seguida. Naquele dia, eles encenariam a peça em uma igreja, na zona leste de São Paulo.

Piveta saiu do Largo São Francisco. O comboio transportava cenário, figurino, iluminação e os atores. Foram seguidos o dia todo por agentes do DOI-Codi. À noite, após a apresentação, Idibal foi acompanhar Tânia até sua casa. Foi ali que acabou preso com sua atriz - os militares estavam atrás do namorado dela, que mantinha ligações com a Aliança Libertadora Nacional (ALN). "Quando eu vi ele no DOI, pensei: estamos fritos. prenderam até o nosso advogado", contaria anos depois o ex-deputado estadual Adriano Diogo (PT).

"Queriam que eu assumisse um comando das esquerdas", contou Piveta. Na casa do advogado, apreenderam um mapa da região de Sete Povos das Missões, que seria tema de sua próxima peça teatral: Mortes aos Brancos, a Lenda de Sepé Tiaraju. "O Ustra (coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, comandante do DOI) foi na minha cela e me convidou para jogar xadrez. Eu me recusei e ele disse: 'Ah, não joga xadrez com a repressão?!' E eu disse que não jogava porque não sabia jogar."

À noite, Tânia que estava na mesma carceragem cantava as músicas de O Evangelho Segundo Zebedeu. Foi nessa época que o grupo amador de teatro passou a receber convites para se apresentar pelo Brasil e no exterior. Primeiro no festival de teatro amador de Nancy, na França. Depois, vieram convites para apresentações em Curitiba, em Varsóvia, em Havana e na África.

Piveta acumulou reconhecimentos no Brasil por seu trabalho. Recebeu o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) de melhor autor nacional por O Evangelho Segundo Zebedeu. Depois vieram o prêmio Dramaturgia Funarte-MinC por Os Joãos e os Magalís - Uma Chegança de Marujos, em 1996, e prêmios Mambembe e Flávio Rangel/MinC por Brasil Quinhentão!??, em 1998.

"Eu fiz parte do Teatro do XI - Evangelho segundo Zebedeu. Idibal sempre me considerou parte do Grupo do Olho Vivo, mas nunca atuei. Mas o Teatro do Onze foi teatro popular da mesma forma", afirmou o criminalista e ex-secretário da Justiça Belisário dos Santos Junior. "Ele era um figura permanentemente indignada contra o que considerava injusto e fazia refletir isso nos seus textos teatrais e nas suas defesas. Era um gigante e um amigo querido que sempre colocava nas alturas. Essa generosidade se foi", concluiu.

Outro que lembrou de Idibal foi o advogado Joaquim Cerqueira Cesar. "Minha amizade com o Idibal aconteceu em um julgamento que teve no STM, famoso da greve do ABC, de 1979. Foi a partir dali que nos tornamos amigos. Eu era estudante. Depois, participamos do julgamento da anistia, se ela se aplicava aos crimes de sangue decorrentes de atos políticos. Perdemos por 16 a 0 no STM, mas ganhamos no Supremo por 4 a 1. O relator foi o Firmino Ferreira da Paz, que ficou vencido", contou Cerqueira Cesar.

À noite, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lamentou a morte de Piveta. Em sua conta no X, ex-Twitter, eles escreveu que Piveta "atuou com coragem na defesa de presos políticos durante a ditadura". Lula prosseguiu, afirmando: "Juntando política e cultura viveu de forma intensa e apaixonada. Soube com tristeza da partida de nosso companheiro".

Com a redemocratização, o grupo de teatro obteve um terreno no Bom Retiro, onde foi montada sua sede, ali perto da outra paixão de Idibal: a torcida Gaviões da Fiel. Piveta deixou sua paixão pelo clube registrada na peça Corinthians, meu amor. Deixou a companheira, a artista plástica Graciela Rodriguez, que cuidava da cenografia, e um filho de outra relação, Lucas Pivetta. O velório será hoje, das 23 horas às 16 horas, na sede do teatro União e Olho Vivo, no Bom Retiro.

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Divergências apresentadas pelo Egito e pela Etiópia à reforma do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas impediram a divulgação de um comunicado conjunto após a reunião de ministros das Relações Exteriores do Brics. Em vez disso, foi divulgada nesta terça-feira, 29, uma declaração da presidência do grupo de ministros, ocupada atualmente pelo Brasil. Houve consenso nos demais temas debatidos.

O texto diz que os ministros presentes à reunião, que ocorreu nesta segunda e terça-feira no Palácio do Itamaraty, na região central do Rio de Janeiro, "apoiaram uma reforma abrangente das Nações Unidas, incluindo seu Conselho de Segurança, com vistas a torná-lo mais democrático, representativo, eficaz e eficiente, e a aumentar a representação de países em desenvolvimento nos quadros de membros do Conselho".

As mudanças teriam como objetivo uma resposta adequada "aos desafios globais prevalecentes" e apoiar "as aspirações legítimas dos países emergentes e em desenvolvimento da África, Ásia e América Latina, incluindo Brasil e Índia, de desempenhar um papel mais relevante nos assuntos internacionais, em particular nas Nações Unidas, incluindo seu Conselho de Segurança".

"Reconheceram também as aspirações legítimas dos países africanos, refletidas no Consenso de Ezulwini e na Declaração de Sirte", acrescenta o texto, que trouxe uma observação mencionando ter havido objeções dos representantes do Egito e Etiópia ao comunicado.

Ambos os países se opõem à eleição da África do Sul como país representante do continente africano. Em coletiva de imprensa, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, negou que tenha havido desacordo ou discordância.

"Não houve nenhum desacordo entre os países com relação às questões do Conselho de Segurança. O que acontece é que cada país tem posições e compromissos assumidos", argumentou Vieira a jornalistas, quando questionado sobre o impacto das divergências regionais no documento final. "Não houve nenhuma discordância, apenas cada país e países membros de grupos regionais, alguns africanos no grupo, apenas declararam suas posições e nós estamos trabalhando para compatibilizar todas as necessidades de cada um desses grupos para a declaração dos chefes de Estado."

As autoridades da Caxemira sob controle indiano fecharam temporariamente mais da metade dos resorts turísticos na região do Himalaia, após um ataque mortal a turistas na semana passada aumentar as tensões entre Índia e Paquistão e levar ao reforço das medidas de segurança na Caxemira.

Pelo menos dois policiais e três funcionários do governo local, que pediram anonimato por conta da política do departamento, disseram nesta terça-feira, 29, que o fechamento de 48 dos 87 resorts autorizados pelo governo foi uma medida preventiva de segurança. Eles não informaram por quanto tempo os locais permanecerão fechados a visitantes.

A decisão foi tomada uma semana depois que homens armados mataram 26 pessoas - a maioria turistas indianos - nos arredores da cidade turística de Pahalgam.

O massacre provocou uma série de reações diplomáticas entre Índia e Paquistão, incluindo o cancelamento de vistos e a retirada de diplomatas. Nova Délhi também suspendeu um tratado crucial de compartilhamento de águas com Islamabad e ordenou o fechamento da fronteira com o Paquistão. Em resposta, o governo paquistanês fechou seu espaço aéreo para companhias aéreas indianas.

A reunião de chanceleres dos países do Brics, no Rio, terminou com uma declaração da presidência do grupo, em vez de um comunicado conjunto. No entanto, ministro das Relações Exteriores brasileiro, Mauro Vieira, destacou que a reunião teve participação expressiva em nível ministerial, o que refletiria um compromisso político dos países com os temas prioritários eleitos pela presidência brasileira do Brics.

"Então, acabamos de concluir essa reunião sobre a presidência brasileira. Foi um encontro de alto nível, marcado por forte engajamento político, pela disposição de promover uma agenda propositiva de soluções para o grupo e para o Sul Global, especialmente num ano tão significativo para o Brasil, que também se prepara para sediar a COP 30 em Belém", disse Vieira a jornalistas, em entrevista coletiva após o encerramento da reunião.

O ministro destacou ainda o fato de o encontro ter sido o primeiro a reunir oficialmente os representantes do grupo após a ampliação no número de países-membros e de países parceiros.

"Não interessa ao Brasil nem aos nossos parceiros do Brics viverem um mundo fraturado. Precisamos fortalecer o multilateralismo e a cooperação como instrumentos para enfrentar os desafios contemporâneos", afirmou Vieira.

O chanceler brasileiro disse que os demais países acolheram "com entusiasmo" os temas prioritários eleitos pelo Brasil na presidência do Brics: saúde global, comércio, investimentos e finanças, mudança do clima, governança da inteligência artificial e reforma da arquitetura multilateral de paz e segurança e desenvolvimento institucional.

"Houve manifestações claras sobre a necessidade de fortalecer o papel das Nações Unidas, com destaque para a urgência da reforma do Conselho de Segurança, de modo a torná-lo mais representativo, legítimo, eficaz, sobretudo com maior participação da África, Ásia e da América Latina", relatou Vieira.

"Tratamos da reforma da governança global, em especial das instituições econômicas e financeiras internacionais. Todos os países foram unânimes em defender uma maior representatividade do Sul Global nos mecanismos de decisão do sistema multilateral, incluindo o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e a Organização Mundial de Comércio."

A Declaração da Presidência da Reunião de Ministros das Relações Exteriores/Relações Internacionais dos Países Membros do Brics mencionou o uso ampliado de moedas locais entre os países do grupo.

"Os Ministros destacaram a importância do uso ampliado de moedas locais nas compensações comerciais e financeiras entre os países do BRICS e seus parceiros comerciais. Recordaram o parágrafo 66 da Declaração de Kazan, que incumbiu os Ministros da Fazenda e Governadores de Bancos Centrais, conforme apropriado, de continuar a apreciação da questão das moedas locais, instrumentos de pagamento e plataformas, e de relatar aos Chefes de Estado e de Governo do BRICS, incluindo o estudo da viabilidade da Iniciativa de Pagamentos Transfronteiriços do BRICS, BRICS Clear e o reforço da capacidade de resseguro do BRICS", diz o texto, divulgado nesta terça-feira, 29.

China

Na mesma ocasião, Mauro Vieira disse que o Brasil mantém uma relação política e comercial importante com a China, assim como tem longo histórico de relações diplomáticas com vários outros países, como Argentina e Estados Unidos, estando sempre disposto também a conversar com nações individualmente. A afirmação foi feita após o ministro ser questionado sobre se o Brasil poderia se beneficiar da guerra comercial entre China e Estados Unidos, em meio a um aumento das compras chinesas de produtos brasileiros.

"O Brasil e a China têm uma relação política e comercial muito importante. Como o Brasil tem com vários outros países do mundo", afirmou o ministro, lembrando que o País tem 200 anos de história de relações diplomáticas com a Argentina, com os Estados Unidos, com a França, com a Áustria e "tantos outros países". Para Vieira, o Brasil é, sobretudo, "um ator global". "Temos relações próximas com todos os países. O que nos move é o interesse nacional em todas as relações."

O ministro lembrou que o Brasil busca relações baseadas "no direito internacional e nas regras estabelecidas em todos os organismos". "E é isso que vamos continuar a promover e a debater. Sempre prontos a também a conversar com cada país bilateralmente, como fazemos tradicionalmente", declarou Vieira a jornalistas, em entrevista coletiva após o encerramento das sessões ministeriais da reunião de chanceleres dos países do Brics, no Palácio do Itamaraty, na região central da capital fluminense.